Os limites da discussão ou porque é tão difícil não nos espumarmos com a opinião dos outros
COMO É POSSÍVEL NÃO PENSARES COMO EU? É o que nos passa pela cabeça enquanto tentamos não gritar na cara do outro.
Este fim-de-semana, tive dois episódios que suscitam este post.
O primeiro foi na sexta à noite, depois de um jantar agradável e ameno com uma velha amiga (gosto da expressão, lamento), já quando estávamos a despedir-nos (um conhecido meu chileno é que dizia que os portugueses demoram horas a despedir-se), começámos a falar daquela odiosa lei francesa que proíbe o uso de sinais religiosos exteriores nas escolas públicas. Começámos a falar disso porque expulsaram 2 miúdas muçulmanas (uma de 12 e outra de 13 anos) da escola. Como já perceberam pela palavra "odiosa", eu abomino a lei, acho-a fascista e segregacionista, mesmo tendo em conta a terrível expressão de inferioridade que o véu islâmico representa para a mulher. Mas não me vou alongar nesse assunto. O que interessa é que a minha velha amiga, que eu admiro pelas ideias que defende, por ser progressista e inteligente, não concordava comigo. Pelo contrário, achava a lei muito boa! Eu quando dei por mim, já estava aos gritos a chamar arrogante à lei e aos franceses e a dizer "COMO É POSSÍVEL? NÃO ESTÁS A VER AQUILO QUE EU ESTOU A VER? É TÃO ÓBVIO!". Obviamente que eu é que estava a ser arrogante e prepotente. Mas na altura eu queria apenas que a minha argumentação fosse perfeita a ponto de não haver outra hipótese se não convencê-la. Enfim.
O outro episódio foi com outro amigo, não tão próximo nem tão velho, que encontrei no cinema e que me disse, na cara sem pudor, que tinha saído a meio do "Antes do Anoitecer" porque tinha achado o filme intragável. Eu ainda tentei compreendê-lo, mas desisti. Houve um momento em que soube se continuasse com aquela conversa, teria de tomar medidas drásticas contra a sua integridade física.
Vai daí esta reflexão. Quase a toda a hora encontro pessoas com posições e gostos diferentes dos meus. Mas a maior parte das vezes, encolho os ombros com indiferença e sigo a minha vidinha. Quando são pessoas mais próximas, exalto-me, porque não estou à espera que pensem de forma diferente daquelas que eu supus que pensassem.
Os preconceitos em relação às pessoas são os piores. Destrõem a capacidade de nos conhecermos uns aos outros uma e outra vez. Descobrirmos o outro novamente.
Continuo a achar a lei fascista e que atenta contra a liberdade. Continuo sem perceber como é que alguém sai a meio do "Antes do anoitecer". E sem saber bem qual a plataforma comum de entendimento. O berro e o encolher de ombros não são de certeza.
2 Comments:
At 3:33 da tarde, Anónimo said…
Vós devieis controlar o seu temperamento.
Orgias de sangue não levam lado nenhum. Vede o caso de Bush.
No entanto, orgias de outras coisas levam a muito lado. Ora, isso inspira-me um momento poético-demagógico:
"Batem leve, levemente,
como quem chama por mim.
Foi ver quem era.
Era a Sandera a enterrar cadáveres no jardim".
Para a próxima faço um haiku.
At 1:00 da manhã, Anónimo said…
Então e se eu achar a lei (e os franceses) odiosa (odiosos) e tiver saído a meio do Antes do Amanhecer?
As discussões que o meu eu das manhãs teria com o meu eu das noites davam para horas.
Uma discussão não se ganha convencendo a outra pessoa, ganha-se convencendo o público (o júri ou juiz, os eleitores, o Marcelo Rebelo de Sousa antes de ele ser purgado, etc). Sem público, não há desporto.
Ou se é para tentar convencer o outro, é preciso pôr a hipótese da outra pessoa nos convencer. Ou pelo menos, nos dar argumentos e pontos de vista. Senão, está perdido à partida.
Ass: o amigo nem tão próximo nem tão velho.
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