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Duas boas amigas juntam-se para desarrumar os bibelots.

domingo, dezembro 19, 2004

A auto-censura

Ultimamente tenho-me deparado com alguns problemas culturais da forma humana, ou pelo menos portuguesa, de as pessoas se expressarem. Tanto emocionalmente como socialmente, devo dizer.
Por exemplo, este blog. Como espaço de liberdade que é, à partida deveria ser a expressão daquilo que nos vai na alma (uma boa frase feita). Mas a verdade é que, de facto, há uma imposição própria que nos obriga a traçar limites que, no início, não acharíamos previsíveis e muito menos necessários. Há aquela história de um indivíduo lá para o norte que foi despedido, porque tinha um blog em que afirmava as suas posições políticas. Independentemente de ser verdadeira ou não, a história é significativa, porque coloca a problemática de saber quem nos lê e com que intenção.
Depois há outros limites claros. Sabendo que existe uma audiência virtual, cuja posição ou relação connosco desconhecemos, está presente na mente que há coisas emocionais/pessoais das quais não queremos falar, sob pena de alguns desses leitores comprometerem alguma coisa da nossa imagem. Enfim, não queremos mostrar as cartas todas e, nessa auto-censura, vamos deixando de escrever em momentos mais fortes da nossa vida pessoal e emocional.
Nem por isso deixamos de ser verdadeiros, mas há algo que se perde.
Socialmente falando, tenho identificado um problema comum a muita gente: a incapacidade em dizer o que se sente. É uma espécie de medo que invade as pessoas, impedindo-as de estabelecerem relações significativas com os outros, mesmo sem compromisso. Como se, ao dizermos o que sentimos, estejamos já a abrir uma porta para o compromisso ou para a ruptura.
Há a questão do sexo, por exemplo. No outro dia, discutia com um amigo a questão de falar ou não falar com a pessoa no dia seguinte. Esse meu amigo achava que, numa relação casual (não estou a falar de sexo com desconhecidos), não sentia necessidade de falar com a pessoa sobre o acontecido. Eu defendia o contrário, acreditando que o acto sexual, mesmo descomprometido, é um acto íntimo sobre o qual se deve falar e que abre a porta para outras camadas emocionais. E falar não para dissertar sobre os pormenores, mas para não deixar aspectos mal resolvidos.
No limite, eu defendo que ir para a cama com alguém significa começar uma relação com alguém, ou torná-la diferente. Não falo de começar uma relação amorosa, mas uma relação mais verdadeira. Encaro assim o sexo como uma forma de nos aproximarmos de alguém e não o contrário.
Pois, talvez seja ingenuidade minha. As pessoas não querem falar, não querem aproximar-se muito, têm medo. Eu também tenho - ninguém é perfeito - mas de que serve a vida se não tentarmos chegar mais rapidamente ao outro?
O medo onde nos levará, agora que começamos "a ter as primeiras rugas"?

1 Comments:

  • At 12:20 da tarde, Anonymous Anónimo said…

    Aqui me estreio! Sem qualquer problema de expressão, diga-se. De facto quem se expressa sem preconceitos quer sempre que os outros o façam de igual modo! Sem entraves , sem medir as palavras, os gestos, tudo. Mas isso não acontece... é raro! Existe uma contenção latente e não sei porquê, mas que irrita irrita! Uns dizem que é feitio, que não é defeito. Sinceramente acho esta frase bastante fácil para se desviar um assunto, mas cada um sabe de si. Eu sei de mim e sei também que tenho tido resultados bem mais satisfatórios para comigo e para com os outros quando digo o que sinto, tenha o assunto um teor "sexófrutal" ou não. E em relção a este especificamente, concordo ana vicente, com uma conversa pós acontecimento. E não é conversa de gosto não gosto, é claro, essa não interessa, mas sim, e volto a concordar, uma conversa emocional que reflicta o que se passou: o surgimento de uma "outras camadas emocionais" (citando). Infelizmente nem todas as pessoas entendem que falar não significa comprometer e por isso olha... vamos vivendo adivinhando!

    Bem, não sei se o que escrevi serve para alguma coisa, mas a verdade é que já andava a sentir uma certa pressão por parte da minha amiga ana vicente no sentido de me expressar aqui no blog, e por isso cá está!
    EHEHE desculpa... é que digo o que penso ;) Não me contenho! :))

    AM (ana maria ou ana margarida para quem não identifique)

     

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