naperon

Duas boas amigas juntam-se para desarrumar os bibelots.

domingo, maio 22, 2005

ATENÇÃO: post escatológico

E não me refiro à escatalogia como a parte da Teologia que se refere às coisas que deverão suceder no fim do mundo, mas mesmo àquela relativa aos excrementos (esclarecer dúvidas aqui).
Tudo isto a propósito de penicos. Há uns dias tive a infeliz ideia de partilhar com algumas pessoas uma metáfora em que usava uma imagem escatológica. Houve quem tivesse levado a mal e eu até percebo. Mas isso fez-me reflectir sobre os limites da linguagem: ninguém quer ouvir falar de cocós nem dessas coisas, a não ser que sejam de bebés ou de animais (e mesmo assim).
Hoje, com a criança, assisti à leitura de uma história infantil deveras interessante. A toupeira que queria saber quem lhe fizera aquilo na cabeça conta a história de uma toupeira que, num belo dia, sai do buraco na terra onde vive e leva com um cocó (para não dizer cagalhão) em cima da cabeça. Ora, o resto da história está no título: a toupeira pergunta a cada animal que encontra se lhe fez aquilo em cima da cabeça. Cada um dos variadíssimos animais defende, demonstrando, in loco, que o seu cocó nada tem a ver com aquele que pousou em cima da cabeça da pobre toupeira. É um livro bastante didáctico, como podem imaginar, porque se todos os outros livros dizem como faz a vaca por exemplo, neste diz como faz realmente a vaca. A toupeira só descobre o autor da façanha quando duas moscas provam o excremento, durante toda a história pousado na cabeça da dita. Achei a história brilhante, genial até, fartei-me de rir, como só as crianças se riem quando repetem até à exaustão chichi cocó chichi cocó chichi cocó.
Há ainda outro livro infantil fantástico, desta vez apenas acerca de puns. Oh João! Foste tu, porcalhão? é um retrato detalhado não só dos puns do João, como também dos da sua família. No final, o João conclui que, apesar de censurarem os seus, todos dão também os seus punzinhos sorrateiramente. No entanto, os dele são os melhores.
Gosto deste lado descomprometido em relação a uma coisa que toda a gente faz, mas que quase ninguém consegue realmente assumir que faz. Eu, por mim, falo - mas eu sou das poucas pessoas que não faz cocó.
Por muita brincadeira que se tenha feito na infância e na adolescência (principalmente entre rapazes, pois eu cresci entre eles e sei coisas), por muita abertura que se tenha em muitos assuntos, existe esse tabu. Longe de mim censurar, aprecio-o e voto a favor, não me compreendam mal - não defendo a livre circulação de gases nem a troca de amostras. Questiono apenas a censura do cocó - se todos o fazem, para quê tanto segredo?

4 Comments:

  • At 2:39 da manhã, Anonymous Anónimo said…

    Quando eu era pequeno e folheava o Antigo Testamento contado às crianças e ilustrado com gravuras de Gustave Doré, via aí uma imagem do Bom Deus em cima de uma nuvem. Era um senhor bastante velho, com olhos, nariz, uma grande barba e eu achava que como tinha boca também devia comer. E se comia, também devia ter intestinos. Mas ficava logo assustado com a ideia porque, embora a minha família fosse quase ateia, percebia bem a blasfémia que era pensar que Deus tinha intestinos.

    Sem a mínima preparação teológica, com toda a espontaneidade, a criança que eu era então já compreendia que há incompatibilidade entre a merda e Deus e, por consequência, a fragilidade da tese fundamental da antropologia cristã, segundo a qual o homem foi criado à imagem de Deus. Das duas, uma: ou o homem foi criado à imagem de Deus e Deus tem intestinos, ou Deus não tem intestinos e o homem não se parece com ele.

    Os gnósticos antigos sentiam-no tão claramente como eu aos cinco anos. Para acabar de uma vez por todas com este maldito problema, Valentino, Grande Mestre da Gnose do século II, afirmava que Jesus “comia, bebia, mas não defecava”.

    A merda é um problema teológico mais difícil do que o mal. Deus ofereceu a liberdade ao homem e, portanto, pode admitir-se que ele não é responsável pelos crimes da humanidade. Mas a responsabilidade pela existência da merda incumbe inteiramente àquele que criou o homem, e só a ele.

    (Milan Kundera, A Insustentável Leveza do Ser)

     
  • At 10:43 da manhã, Anonymous Anónimo said…

    Obrigado Ana Vicente e j.c.t.p por me fazerem rir tanto logo pela manhã de segunda feira!!
    Eu sou verdadeiramente como os putos! Rio-me até chorar com histórias de puns e cócós, não sei explicar mas é mais forte que eu!! QUERO LER ESSA HISTÓRIA DA TOUPEIRA!!!

    a.m.

     
  • At 10:45 da manhã, Anonymous Anónimo said…

    Adianto também que o link do João porcalhão não está disponível... deve ser um tipo qualquer de censura virtual que não sabia que existia.

    a.m.

     
  • At 5:25 da tarde, Blogger ana vicente said…

    Não sei, de facto, o que se passa com o link. Ontem estava a funcionar perfeitamente. De qualquer modo, a capa, como podem constatar em qualquer livraria, é o joão porcalhão a dar uma bufa...

     

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