Há já alguns anos que a minha relação com o Natal tem sido desvirtuada. De facto, lembro-me que o Natal era antes uma coisa sobre mim. Eu fazia a lista dos brinquedos que eu queria receber, mais tarde dos livros, dos cds e dos filmes. A partir do momento em que tens casa e trabalho, a tua lista começa a centrar-se em electrodomésticos e artigos de decoração. E tu pensas, oh Deus, aburguesei-me, estou a receber os mesmos presentes que os meus pais. E, mais estranho, a partir desse momento, começas a ter de fazer uma outra lista: a das prendas dos outros.
Não me interpretem mal: EU ADORO DAR PRENDAS!
A questão não é essa. A questão tem a ver com a ansiedade. Eu não faço a mínima ideia do que é que quero receber no Natal, mas a minha cabeça fervilha em busca de ideias para as prendas dos outros. A ansiedade não está em receber mas em dar. E isso parece-me, para contrariar a nossa estrutura emocional carente, um grande avanço.
Isto vem também a propósito de um artigo que saiu hoje no Público (o link está no título) sobre um estudo europeu realizado pela Duracell (gente pouco interesseira esta) sobre as prendas que os europeus oferecem às suas crianças. Parece que as crianças portuguesas recebem menos brinquedos! Ao que parece, os pais portugueses "só" gastam 88 euros de média nas prendas dos seus filhos, entre quatro a cinco brinquedos. Os nossos compadres europeus gastam 140 euros e compram em média 7 brinquedos.
QUE É ISTO, SENHORES?
Não bastava a malta andar para aí a querer ter um telemóvel topo de gama, um carro xptónico e uma roupa cool, agora ainda nos obrigam a comprar mais brinquedos? Pior, não bastava já nos acharmos maus em tudo, ainda por cima somos acusados de sermos fuínhas em relação aos nossos filhos? Não nos podem dar um tiro na cabeça? Para quê tanta violência? Acho inacreditável que estes estudos saiam a um mês do Natal, que terrível coincidência. Imagino os pais de norte a sul a pensarem "não quero estar na cauda da europa. O meu filho merece mais, ele também é europeu. Vou individar-me um pouco mais. Vamos estoirar o Visa! A máfia russa ainda me pode dar crédito."
Espero que os portugueses olhem para a porcaria do estudo e pensem naquilo que é mais importante e revelador no mesmo: as crianças portuguesas têm como segunda actividade favorita (a um ponto percentual de brincar) ver televisão. Isso sim é preocupante. É aí que eles podem sentir-se ameaçados na qualidade da sua maternidade/paternidade.
Eu tenho uma criança na minha vida e vou-me esforçar este ano por estar abaixo dos 88 euros (soma bem redondinha até e graúda para a minha lista de prendas). Orgulho-me disso: revela discernimento e contenção!
Cambada de chulos, perdoem-me a expressão!